Saiba o segredo de Chaves ser tão amado pelas gerações.

Em 1973 ou em meados de 74, a esquete Chaves começou a ser gravada como extensão dos quadros já existentes, Peterete e Chompiras e a Mesa quadrada que levava no elenco, Roberto Bolaños, Don Ramon, Carlos Villagran. Ainda que outros atores tenham composto, o trio criou a marca da comédia do México nos anos 70-90.

Mas sua redefinição de comédia não é tão significativa como muitos pensam. Mas por que será que Chaves e Chapolin os quadros mais famosos fazem tanto sucesso? Mais do que Xaveco, Chompiras e outras esquetes livres do grupo. A razão é mais óbvia que pensar que Roberto Bolaños era um gênio, mas sim alguém que pensava com obviedade.

Sua maior referência era claramente Charles Chaplin. Parte dos seus personagens, próprio Chaves (O pobre), Seu Madruga (O vagabundo) são arquétipos do famoso ator britânico que fez “Tempos Modernos” e o arriscado “Ditador” em 1943, zombando de uma figuras mais macabras do século 20, já em plena Guerra.

Artista do cinema mudo redefiniu a comédia para um novo patamar. Mas não inventou mais do que continuou. Legados já existiam naquela época. E a comédia pastelão nasceu no circo, nas apresentações, nas atrações anteriores a TV e ao Cinema. Todas eram advindas dos teatros. As palhaçadas eram a veia cômica. Logo Charles Chaplin não ‘criou nada’, apenas adaptou as brincadeiras espontâneas do teatro para o cinema.

O ator mexicano Roberto Bolaños nunca escondeu a admiração que tinha pelos trabalhos dos grandes nomes da história a arte. E brincava com o público. Removia a quarta parede como Oscar Wilde teorizava, que com certeza antes dele também. E se ainda até aqui todos esses não inventaram e sim passaram para frente, o que fez Chaves ser tão aclamado por diversas gerações?

Em 1984, o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), comprou as licenças da então Televisa para transmitir o programa que já dava sinais de término no México, com parte do elenco já divididos em seus próprios projetos. Talvez, ninguém sabe dizer, com a morte do intérprete Don Ramon (Seu Madruga) em 1988, o seriado tenha se tornado um ícone mundial.

Com 5 anos no Brasil, com certeza que a figura carismática do programa daria um sabor especial. Sua partida elevou o valor que o programa tinha. E ainda que ele fosse paizão dentro e fora. Isso nos oferece uma pista porque a comédia do Chaves e Chapolin fez e faz tanto sucesso.

Xaveco, mesa quadrada eram programas mais adultos. Um tinha um lado mais Caceta e Planeta do tipo Tv Pirata com esquetes voltadas ao público crítico social e político. E outro tinha uma pegada mais adulta com vocabulários menos afetuosos e com atuações mais voltadas para presepadas de mulheres casadas, roubo de jóias e confusões numa versão do Hotel dos Trapalhões.

Claro que as piadas ali era uma versão mais madura das que existiam no programa do Chaves. Mas a razão das piadas do Chaves serem engraçadas, mesmo após vermos mil vezes. É porque elas foram construídas para entreter crianças. Você não leu errado. Chaves e Chapolim são quadros do empreendimento para o público infantil.

Não tem piadas com palavrão, exceto o Xaveco, porque o público eram as crianças. Notem que a narrativa de explorar as loucas situações beiravam o absurdo e ridículo, da simplicidade ao caos. Seu Madruga sempre recebia um tapa da D.Florinda. Numa narrativa mais adulta e complexa, ela nunca despenderia um tapa na cara dele.

Liga o fato do Quico sempre reclamar com ela, e nunca duvidar da verdade. A narrativa para crianças pega o óbvio e o caminho direto. É só ler um livro para crianças e você vai perceber que a definição é assim:

“O urso ficou com sono. Portanto ele foi dormir.”

Não há obstáculos. Não há necessidades. Todos os problemas foram resolvidos. As tramas não são complexas. Se fosse adaptado para um texto mais complexo seria:

“O grande predador não alcançou sua presa à tempo. Desnorteado pelo cansaço, resolve procurar um lugar seguro e pronta vigília para descansar, mas atento ao odor no vento.”

Nenhum urso é uma ‘coisa de pelúcia bontinha’ com em contos infantis. Na realidade, ursos são predadores territoriais. Constantemente sua atenção está voltada para caçar e evitar ser caçado. Com certeza que dormir não seria uma tarefa comum em sua lista de afazeres, como se ele quisesse ou fosse respeitado o direito de dormir sem problemas. E sem um motivo aparente.

Chaves tinha passagens assim. Como o fato do Quico ser tão burro, e não ser possível nem para uma criança de 8 anos esse fato. Ou que o relacionamento da D. Florinda e o Prof. Girafalles não gere um descontentamento dos outros pais, devido a relação Professor/a e mãe/pai de aluno que tanto na vida real dá o que falar. Se fosse numa novela mexicana, só este fato poderia ser o argumento principal.

As piadas se concentram em situações engraçadas e não em piadas propriamente ditas. Com a trama simples e as piadas espontâneas, e claro, uma ajudinha da nossa dublagem que não deixa para menos, deixou o seriado engraçado. E tenha certeza que os quadros Chaves e Chapolin fizeram tanto sucesso, que muitas pessoas não sabem nem da existência das outras partes das esquetes.

Essa é a comparação indireta por exemplo das piadas dos quadros brasileiros que muitos mencionam usar baixarias para contar histórias. Ou os Stand-ups, que raros são, os que sabem contar uma piada sem envolver xingamento ou uma situação delicada. A sutileza das piadas do Chaves partem da parte que, é um programa infantil.

Por exemplo, nenhum Standup é para crianças. Nenhum quadro do extinto programa Caceta e Planeta eram para crianças. Os Trapalhões eram. As piadas parecem diferentes? Na maioria das vezes, eram iguais, mas o nível delas mudavam conforme falamos sobre públicos. E apesar de ninguém se importar de ver ou de saber disso, adultos gostam de Chaves pela simplicidade devido ao toque de ser um programa infantil.

O mesmo vale para casos óbvios e atuais: Olhe o programa de comédia americano ICarly. Olhe a trama de 2007-2012 e olhe a atual. Perceberam que as piadas do antigo era mais inocentes, mas as mesmas do que do programa atual? As do atual são mais ‘sujas’. O público do de antes era o infantil e adolescente. O atual é para quem está na faixa dos 30 anos.

Teve um crítico que afirma que o ICarly de hoje é mais triste. Essa é uma definição correta. Por quê? A ideia do ICarly de 2007-2012 era de entreter adolescentes. Com uma pitada menos dramática, mas divertida. A atual é de entreter adultos que estão na fase das responsabilidades, e que o mundo não é tão arco-íris. Então certa coisas que geravam magia na infância, hoje descobrimos a real.

Mesmo em 2012, a temática do programa já era mais adulto. Aliás a atriz estava com 19 anos e não mais com 14 anos.

Portanto o programa pode ser menos atrativo, ou menos ‘colorido’ ou até mal encarado para alguns. Comparem os programas antes e depois:

  • Full House vs Fuller House
  • ICarly (2012) vs ICarly (atual)

Vejam um filme que temática infantil:

Caça-fantasma. Sim ele tem temática infantil. Apesar da comédia deixar tudo mais leve. Estamos falando de um filme que tem o mesmo conceito de Sobrenatural, REC e Exorcista. Os caças são exorcistas. Mas a ideia é menos temerosa. Se tirarmos a comédia teremos um filme mais ‘sombrio’. Compare os filmes de 1984 e 1989 com a versão de 2020.

Os dois primeiros são mais inocentes. Este último já bate em uma questão mais madura.

E para concluir, Chaves continua sendo um dos melhores seriados. Bom que as produtoras entendessem, que a comédia não precisa ser pesada para ser boa.